31 de outubro de 2013

NOSSO ETERNO POETA CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE. NASCIDO EM ITABIRA 31 DE OUTUBRO DE 1902


  • JOSÉ

    E agora, José?
    A festa acabou,
    a luz apagou,
    o povo sumiu,
    a noite esfriou,
    e agora, José?
    e agora, Você?
    Você que é sem nome,
    que zomba dos outros,
    Você que faz versos,
    que ama, protesta?
    e agora, José?

    Está sem mulher,
    está sem discurso,
    está sem carinho,
    já não pode beber,
    já não pode fumar,
    cuspir já não pode,
    a noite esfriou,
    o dia não veio,
    o bonde não veio,
    o riso não veio,
    não veio a utopia
    e tudo acabou
    e tudo fugiu
    e tudo mofou,
    e agora, José?

    E agora, José?
    sua doce palavra,
    seu instante de febre,
    sua gula e jejum,
    sua biblioteca,
    sua lavra de ouro,
    seu terno de vidro,
    sua incoerência,
    seu ódio, - e agora?

    Com a chave na mão
    quer abrir a porta,
    não existe porta;
    quer morrer no mar,
    mas o mar secou;
    quer ir para Minas,
    Minas não há mais.
    José, e agora?

    Se você gritasse,
    se você gemesse,
    se você tocasse,
    a valsa vienense,
    se você dormisse,
    se você cansasse,
    se você morresse...
    Mas você não morre,
    você é duro, José!

    Sozinho no escuro
    qual bicho-do-mato,
    sem teogonia,
    sem parede nua
    para se encostar,
    sem cavalo preto
    que fuja do galope,
    você marcha, José!
    José, para onde?
    Carlos Drummond de Andrade

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