22 de fevereiro de 2013

PARABENS DR. GERIVALDO NEIVA


Para cumprir a lei, o INSS viola a Constituição


Autos: 000178.....2010
Autor: G. C. A.
Réu: INSS

Benefício previdenciário. Portador de deficiência. Suspensão. Violação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e dos objetivos da República consistentes na construção de uma sociedade justa e solidária, erradicar a pobreza e promover o bem de todos. Possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a 1/4 do salário mínimo. Tutela antecipada. Restabelecimento do benefício.

Em síntese, alega o autor que passou a receber benefício de amparo social a pessoa portadora de deficiência desde 04.12.2002, em vista de sua deficiência física, neurológica e psíquica, sendo o benefício suspenso em 01.04.2009, sob alegação de que sua genitora, único membro do grupo familiar, passou a receber benefício próprio no valor de um salário mínimo.
Juntou os documentos de fls. 08 a 67, incluindo fotografias do autor.
Preliminarmente, requereu a antecipação dos efeitos da tutela para ter restabelecido o benefício suspenso.
Depreende-se dos documentos apresentados que a família em apreço é constituída pelo autor e sua genitora, uma senhora com mais de 70 anos de idade e saúde debilitada. O autor, com 36 anos de idade, órfão de pai, segundo o relatório médico de fls. 16, “é portador de paralisia dos membros, idade intelectual de aproximadamente 3 anos, não reúne condições para desempenhar funções do dia a dia, higiene pessoal, alimentação, locomoção etc, em caráter definitivo.”
Sendo assim, prover o sustento e a dignidade de uma pessoa nessas condições, sem dúvidas, demanda cuidados médicos, remédios e assistência de pessoa capaz de lhe auxiliar nas necessidades básicas, importando em despesas superiores a um mísero salário mínimo. De outro lado, o recebimento de outro benefício por sua genitora, pessoa idosa e com saúde debilitada, também no valor de um salário mínimo, servirá apenas para lhe possibilitar a dignidade e sobrevivência própria.
Portanto, suspender o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo para um ser humano nestas condições, em última análise, significa violar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e remar contra os objetivos da República: construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e promover o bem de todos. (art. 3º, CF).
É certo, no entanto, que o Supremo Tribunal Federal já declarou a constitucionalidade do dispositivo que estabeleceu o limite de renda mensal familiar em ¼ do salário mínimo para concessão do benefício de amparo social, mas a interpretação deste dispositivo, em face dos princípios constitucionais, não deve obedecer a critério meramente literal, descuidando da questão maior, que é garantir a dignidade e subsistência física de um grupo familiar.
Neste sentido, é emblemático o julgamento do Superior Tribunal de Justiça em que foi Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7.  Recurso Especial provido.
REsp 1112557 / MG - 2009/0040999-9 - Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO - Órgão Julgador: - TERCEIRA SEÇÃO - Data do Julgamento: 28/10/2009 - Data da Publicação/Fonte: DJe 20/11/2009 – RSTJ, vol. 217, p. 963.
Recentemente, em 20.05.2010, o mesmo entendimento foi ratificado no julgamento de Agravo Regimental em Agravo de Instrumento pelo STJ:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp. 1.112.557/MG, representativo de controvérsia, pacificou o entendimento de que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
4. No presente caso, ainda que não se exclua do cálculo da renda familiar o benefício previdenciário recebido por um dos membros do grupo, como pretende o recorrente, restou consignado pelas instâncias ordinárias, com base no conjunto fático-probatório dos autos, a condição de miserabilidade do recorrido e, por conseguinte, o pedido de concessão do benefício assistencial foi julgado procedente.
5. A alteração dessa conclusão somente seria possível através do reexame de prova, o que, entretanto, encontra óbice na Súmula 07/STJ.
6. Agravo Regimental do INSS desprovido.
AgRg no Ag 946710 / PR - 2007/0226126-6 - Relator(a) Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO - Órgão Julgador: QUINTA TURMA - Data do Julgamento: 20/05/2010 - Data da Publicação/Fonte: DJe 21/06/2010.
Isto posto, em face da prova documental produzida, presentes os requisitos do artigo 273, do CPC, antecipo os efeitos da tutela para determinar ao requerido que restabeleça, imediatamente, o benefício de amparo social que recebia o autor como portador de deficiência física e psíquica, sem prejuízo do benefício recebido também por sua genitora.
Cite-se e intime-se.

Conceição do Coité, 20 de julho de 2010

Bel. Gerivaldo Alves Neiva
Juiz de Direito

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